sábado, 16 de novembro de 2013

O último choro da infância

Era uma agradável manhã de sábado quando Enzo passeava com os pais na badalada rua 25 de março, coração de São Paulo. As compras de Natal já haviam se iniciado e Enzo, que completaria 12 anos semanas antes da esperada noite natalina, já sabia que seria agraciado com o videogame que cobiçara tanto e uma bicicleta nova para substituir a sua antiga e já surrada "companheira de viagens". Mas ele queria mais! A versão 3D de Detetive e um deck de cartas para incrementar seu magic. Era justamente por isso que ele resolvera acordar cedo naquele sábado e acompanhar os pais, ao invés de comparecer à sua sagrada escolinha de futebol. 

Sua determinação era tanta que, em pouco tempo, ele avistou uma loja perto da esquina com a Senador Queirós e convenceu os pais a entrar sob a justificativa de comprar o presente de sua prima Júlia. Em menos de dois instantes, ele já carregara um carrinho com seus brinquedos pretendidos e uma boneca miniatura para sua prima. Porém, os pais logo perceberam o golpe que estavam prestes a serem vítimas e ordenaram que Enzo devolvesse os demais presentes, escolhendo apenas uma boneca decente para Júlia. 

Como última estratégia, Enzo começou a chorar. Aquele choro pirracento e irritante que toda criança sabe fazer com perfeição! Entretanto, seus pais estavam determinados e não cederam à chantagem emocional. E então Enzo, derrotado, teve como única opção devolver os brinquedos em suas respectivas prateleiras e rumar, cabisbaixo, em direção à fila para que seus pais pagassem os enfeites de Natal e a boneca de sua prima. Surpresa dos três quando um senhor que acompanhou todo o "show" de Enzo cutucou a família e pediu permissão para presentear o garoto. Os pais de imediato negaram, então o senhor apenas tirou calmamente uma foto antiga de sua carteira e entregou aos pais de Enzo contando a seguinte estória: 

"Esse é meu filho. Na foto ele já está carequinha. Era a Leucemia! Um ano antes, ele me pedira um carrinho de controle remoto no Natal e eu neguei, pois queria juntar dinheiro para pagar sua Universidade. Em menos de um ano, descobrimos que ele tinha a doença, que evoluiu muito rapidamente. Ele se foi antes do Natal seguinte, e eu não tive a oportunidade de entregá-lo o carrinho que ele tanto desejara. Desde então, tenho salvo meus Natais presenteando crianças como seu filho. Ficaria muito feliz se me proporcionassem essa alegria, fazendo o que eu deveria ter feito há tantos anos atrás."

Os pais, bastante comovidos, acenaram positivamente para o senhor enquanto devolviam a foto. Ele, então, guardou a foto, pegou a caixa no chão e entregou para Enzo, dando-lhe um abraço repleto de carinho e desejando-lhe uma vida longa e repleta de felicidades! Enzo agradeceu, e completou dizendo que deveriam existir mais pessoas boas como ele no mundo.

O velho se despediu, deu as costas e seguiu seu caminho. Enzo o acompanhava com o olhar e sentia que algumas lágrimas escorriam pelo seu rosto. Ele sabia que aquelas lágimas não eram apenas simples lágrimas de criança, e que muitas delas ainda viriam. Um sorriso tímido se desenhou em seu rosto.


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