sábado, 12 de julho de 2025

Ponto final

De repente o fim!
Mas quantos fins?
A aranha segue tecendo
uma complexa teia...

Metamorfose silente
No escuro casulo
Que alberga o frio
cadáver de outrora...

E na crua lápide 
Perpetua-se solitária 
A contraditória 
epígrafe final:

"Jaz nesse leito
o protótipo torto
de tudo aquilo
que ainda não fui"

Os trovões dissipam
os transeuntes
E a garoa fina encena
o véu da despedida.

Do temido mar,
Uma maré de ressaca
Entoa a sinfonia de mais
de mil orquestras!

Do úmido solo,
Emerge um delicado
Broto com ares firmes
de uma imponente sequoia!

Do tímido céu,
Uma explosão de cores
Se espalha majestosamente 
como uma anunciação:

Ah, mais um fim!
Daqueles bem agridoces
com abundante recheio
de infinitos recomeços...

terça-feira, 1 de julho de 2025

Na sua estante

Já ouvi várias vezes seu desafogo e palavras me faltam pra qualquer respirar. No atropelo dos vocábulos, só resta o fatídico clichê: Sinto muito! E não seria mentira dizer isso... Sinto muito, e talvez aí more o problema! Primeiramente, senti tanto que criei roteiros um tanto platônicos, seria a doce ilusão?! De muito sentir, experimentei o gosto amargo de uma rejeição que talvez não tenha passado de imaginação. Na expectativa de sentir algo especial, deixei de ver o espetáculo de luzes que só a Liberdade proporciona. Na vontade de continuar sentindo algo, me entreguei a um voo de borboleta, tão lindo quanto breve. Na desesperança de achar digno de sentir, fechei as comportas. Que tolice... Comportas não resistem a excessos e esse golpe foi o trinco final para uma ruptura... Como qualquer ruptura, só resta aguardar para ver os resultados... Mas se queres saber onde estás?! Lembra-te que és avassalador. E como tal, abala estruturas quando chega, acelera batimentos e se mantém vivo pra todo o sempre.  Egos e estantes são muito ínfimos pra segurar a potência de flechas dilacerantes...

sexta-feira, 22 de dezembro de 2023

Sazonalidade

Ora aqui
Outrora acolá...
Garoa fina e duradoura,
Depois um sol de rachar!

Tal qual fina sintonia
Por eras construídas
Nas geleiras da Suíça
Que com um simples assovio
Ou um vento forte e frio
Pode, então, desmoronar...

Mas se não há concretude
Tanto faz palha ou tijolo
Quando vir o velho lobo
E jogar seu vulgo sopro
Num lampejo de desgosto
Vamos ver tudo a voar!

E a fênix pomposa,
Que do fogo poderosa
Emergiu em polvorosa
Pode numa tempestade
Encontrar calamidade
E sua chama apagar...

Já nas mortes do inverno
O galho seco e tenro
Das gramíneas ao relento
Com o sol mantém sustento
E num espicho rebento
Vai se tornar a brotar!

No pasto verde e frondoso 
Ovelha e cordeiro leitoso
Em um sumário dilema:
Se comem xilema e floema
Ou se vale mais a pena
A sombra do ipê a brilhar!

Ah o ipê! As flores! As cores!
Quebram paradigmas,
Interrompem métricas,
Hipnotizam transeuntes,
Distraem casais,
Paralisam o tempo...

E a cada primavera
O amarelo intenso
Da florzinha delicada
Alerta em serenata
Que lá vem mais revoadas
E novo regozijar!







sábado, 19 de agosto de 2023

Distopia

O fraco sol entre nuvens,
O vento ríspido e gélido
Anunciam a tempestade
E com ela a morte de um sonho.

As carícias e afagos,
Os elogios e afetos,
Os gozos e os sentimentos
Ruíram num mar de lama.

No armário agora jaz
O frio anel de brilhantes
Que sequer teve a chance
De aquecer entre seus dedos.

Vendaval de sensações
Encabeçadas pela culpa
De ter feito meu tudo,
Mas, ainda assim, seu nada...

Idealizações implodidas,
Realidade escancarada,
Mas uma vez estapeado
Por aquilo que não se consegue ver...

Até quando habitar nessa distopia?!
Até quando me autossabotar?!
Até quando alimentar vãs expectativas?!
Até quando viver num casulo?!

A estação ainda não virou,
Mas a borboleta precisa voar...

quarta-feira, 28 de junho de 2023

Amor com poréns

Amor: para muitos abstrato,
Há quem diga ser concreto,
Mas não há sábio que diga
Se tem rumo ou canto certo.

Os músicos romantizam,
Os poetas o declamam,
E os casais enamorados
Será mesmo que se amam?

Há quem sofra por amor,
Mas por que sofrer se é bom?
Tem quem pense em morrer!
Que amor fora de tom...

No amor de modernidade
Não se deve confiar!
É match e rolê complicado
Só pra se decepcionar...

E o amor imaginário
Que nem sabe quem tu és?!
Lhe tira sorrisos do rosto,
Mas finca espinhos nos pés...

O amor de longa data
Não vê noite ou sol raiar,
Mas e se uma madrugada
O intenso fogo apagar?!

Amor sem eira nem beira
Nos cafundós se perdeu,
Parece que todos se amam
Todos eles, menos eu...


sexta-feira, 3 de março de 2023

Só mais uma noite de verão

Era fim de tarde de sábado. Recusei dois convites sociais enquanto tomava um restinho de kombucha e assitia trechos de filmes repetidos num canal qualquer. Entre uma e outra mexida no celular, li umas conversas antigas com dates do passado e resolvi que seria melhor deitar mais cedo. Um banho, os creminhos de pele que a idade pede, uma boa escovada nos dentes e, enfim, cama. O silêncio ensurdecedor daquela casa no interior só era quebrado por uma ou outra gia e eventualmente uns pernilongos perdidos, mas não naquele dia. O travesseiro, astuto que só, parece ter ativado as engrenagens do cérebro e o sono, que já estava ali durante o ritual pregresso, num instante desapareceu. Sabe aqueles dias que revemos todas as nossas escolhas e nos punimos por todas as mazelas do mundo? Era hoje! Toda fortuna gasta em sessões de terapia e eventuais remedinhos pareciam só um amontoado de decisões precipitadas... As mesmas velhas tormentas "repaginadas" voltavam a me assombrar e eu pouco sabia como sair daquela arapuca autóctone! Num desespero quase infantil por migalhas de sono, decido contar carneirinhos, e, quando chego aos 37, uma onda de frustração me abate de vez. Seria eu um fracassado por já estar nessa idade ainda sem a estabilidade financeira e emocional que se espera em um adulto?! Um suspiro prenuncia a certeza de uma madrugada insone. O relógio marca 2:39 e decido me levantar para fazer um lanchinho. Na geladeira vazia encontro um iogurte vencido e decido encarar. Enquanto como, penso em quantas validações tenho buscado sem nenhum sucesso e a tristeza se aprofunda ainda mais... Ciente de que o sono é um artigo de luxo fora das minhas pretensões, ligo novamente a TV. Inexplicavelmente, vejo a cena de Alex apanhando do mendigo, já na parte em que o protagonista de Laranja Mecânica está sofrendo as mazelas reversas que outrora causou. Estaria eu colhendo os frutos das minhas péssimas escolhas?! Decido fazer um chá, mas o gás acaba no meio do preparo e deixo aquela água morna no forno. São tantas relações frias que tenho vivido que a temperatura daquela água até funcionaria como um agasalho... Volto pra cama enquanto o relógio já marca 4:04. Tento uma música, e a ironia do destino traz Sozinho, de Caetano 🎶 "eu fico imaginando nós dois" 🎶 nós dois quem?!  Ao perceber que minha situação é pior que eu imaginava, os primeiros raios de Sol chegam para dar o veredicto de mais uma noite perdida. Nunca fui bom de dormir na claridade, então levanto e vou fritar uns ovos e passar um café. Assim, frustrado, reinicio mais um dia esperando que as fadas e os elfos tragam notícias melhores num futuro breve...

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

Fugaz

Quente.
Frio.
E de repente desapareceu!

Pétalas murchas das rosas anunciam que ela morreu.

Paixão maratonista!
Cruzando a chegada
logo após a partida.

Partiu.
Se foi.
Escafedeu!